terça-feira, 23 de maio de 2023

Uma nova jornada

 



Faz um tempo que sinto que finalmente estou começando a viver fora do trauma. Demorou cerca de 10 anos para: descobrir o que é o trauma, perceber que tenho um trauma, admitir que é um trauma, lidar com o trauma e... viver além dele. Não me precipito em escrever que superei o trauma. Nem tudo é para ser superado ou curado. 
Eu raramente escrevo sobre estar feliz, parece muito... falso. Desde os 11 anos escrevo sobre a tristeza como o único sentimento que me deixava realmente feliz. Lendo esses textos antigos eu me sinto muito esquisita, porque eu não tinha NOÇÃO do que era estar mal, mas conseguia dissertar sobre como se fosse minha realidade na época.
Agora para começar os desabafos vamos voltar para minha infância: Eu sempre fui sozinha. Meu pai trabalhava muito, minha mãe não tinha tempo para mim e meus irmãos me odiavam. Eu sempre fui superprotegida então não podia sair de casa para brincar (a não ser pra ir até a minha vizinha M., mas voltaremos com isso mais pra frente) e dependia de alguém vir me visitar (o que não acontecia com frequência). Passei anos jogando jogos de tabuleiro, brincando de secretária, boneca e afins... sozinha. Uma frase que vive na minha cabeça de graça do filme Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças é: "as pessoas não fazem ideia do quão solitário é ser criança". Não é a toa que a psicanálise acredita que tudo começa na infância.
Eu sentia muito a falta de ter alguém, porque era como se eu fosse invisível e indesejável, eu ouvia coisas como "você fala tanto que não consigo ouvir meus próprios pensamentos" ou era cantado pra mim "sai da minha aba sai pra lá, não vê que eu não quero mais você". Lembro de ter pesadelos onde minha mãe me abandonava na rua ou simplesmente preferia a M. do que a mim. Sempre acreditei que minha mãe preferia qualquer pessoa à mim. 
E crescer pensando que eu sou insuportável não me ajudou nos meus relacionamentos. Aliás, não me serviu de nada. É estranho escrever e reviver essas coisas porque atualmente eu não me sinto mais assim. Meu irmão me adora e sempre faz questão de estar perto de mim, de falar comigo. Minha irmã também, mas ela eu me aproximei mais cedo. A última da lista foi minha mãe... era difícil compreendê-la e foi mais difícil ainda lidar com o fato de que eu poderia NÃO QUERER ela na minha vida e odiá-la profundamente, porém a criança dentro de mim estava sentada no chão, chorando e pedindo colo dela. querendo ser vista, amada. Depois disso foi uma luta até aceitar que eu não poderia viver para sempre querendo ter TIDO algo, querendo ter um passado melhor e lamentando não poder voltar e viver tudo diferente. As vezes só podemos aceitar o que temos. E, acreditem, é ótimo.
Sou analisada há 5 anos, mais ou menos, e me formei em psicologia também. Muitas pessoas comentam sobre eu ser louca e psicóloga, que não faz sentido nenhum. Eu já acredito que faz TOTAL sentido. Eu sei como é ser paciente, eu sei como é tomar medicação e querer simplesmente desistir de melhorar, eu sei como é ter recaídas e eu também sei como é querer ir de arrasta pra cima. O negócio é que eu sou constante em lutar contra tudo isso única e exclusivamente porque eu mereço. Eu não quero me sentir amada porque eu sou amada. Eu só preciso permitir o afeto do outro do jeito que o outro pode me dar e não da forma que eu inventei na minha cabeça. As fantasias de afeto são perigosas para mentes conturbadas pelo desejo de desejar.
Quero começar uma série nesse blog, pelo repaginá-lo porque eu adoro escrever e quero compartilhar como está sendo meus dias de melhora. Demorou 10 anos para eu finalmente sentir que eu posso estar feliz, que eu posso me relacionar, que minha mãe me ama. A minha mãe me ama. Eu sou amada.